Luta e resistência marcaram os 74 dias de greve das/os professoras/es da rede municipal de Salvador

As professoras e os professores da rede municipal de Salvador, na última sexta-feira (18), deliberaram em uma assembleia com centenas de docentes, a mudança da estratégia de luta e o final da dura e histórica greve da categoria, que durou 74 dias. As/os manifestantes seguem mobilizadas/os e ressaltam que permanecerão em estado de greve, fiscalizando o cumprimento dos acordos firmados com a prefeitura da capital baiana.

 Como apoiadora do movimento grevista, a ADUNEB manifesta sua irrestrita solidariedade de classe e saúda as companheiras e os companheiros da base e da direção da APLB-Sindicato. Com coragem, a categoria docente da rede municipal de educação enfrentou a truculência e a violência física e psicológica imposta pelo prefeito Bruno Reis (União Brasil) e seus asseclas. Diante da disputa de narrativas criada pelo governo, a reportagem da Seção Sindical ouviu lideranças do movimento grevista e, a título de contribuição, faz um breve histórico dos fatos.

 Segundo docentes que construíram a greve, há 13 anos o piso nacional do magistério não era respeitado em Salvador. Até o acordo da greve feito no dia 18, enquanto o piso nacional da categoria era de R$ 4,8 mil, na capital baiana, o valor era de aproximadamente R$ 3 mil. Nesse período, inúmeras campanhas de reivindicações foram realizadas, tanto na gestão anterior, liderada por ACM Neto (União Brasil), quanto na atual, que se apresenta como uma continuidade de gestão.

 A professora Denise Souza é Coordenadora Pedagógica e atua na rede pública há 20 anos. Ela afirma que a tentativa de negociação com a administração municipal, nesse ano, iniciou em 18 de fevereiro. “Foram quase cem dias de silenciamento da prefeitura em relação a nossa tentativa de abrir a negociação. Tentamos chamar a atenção do prefeito, fizemos várias paralisações, mas ele não quis negociar. Foi nesse momento que entramos em greve”.

 Autoritarismo

 A partir do início da greve, a primeira proposta da prefeitura foi um aumento de 4%, dividido em duas vezes, o que foi rechaçado pela categoria. A segunda proposta era de 6,27%, mas que não contemplou as reivindicações, pois ainda haveria um déficit de quase 58% em relação ao piso salarial.

 Nesse momento, em atitude autoritária, o prefeito de Salvador envia à Câmara Municipal de Vereadores um reajuste salarial feito a partir do desmonte do plano de carreira das/os professoras/es. Além disso, desrespeita a isonomia da categoria e faz um reajuste diferenciado, em que docentes do nível 1 receberiam 9%, e o restante aproximadamente 6%, com pequenas variações. A proposta foi aprovada na calada da noite pelos parlamentares que apoiam o governo, com opressão aos manifestantes que foram impedidos de entrar na Câmara.

 Segundo o Coordenador-Geral da APLB-Sindicato, Rui Oliveira, foram aprovadas três emendas que extinguiram gratificações do plano de carreira, que eram ganhos históricos das/os trabalhadoras/os. Assim, os valores dessas gratificações foram incorporados ao salário-base para criar uma falsa narrativa de aumento e a adequação ao piso salarial nacional.

 Violência

 A manobra política realizada na votação, na câmara dos vereadores, mudou o rumo da greve. A partir de então, a reivindicação que era pelo piso salarial passa a ser pelo piso, mas sem distorções que levassem ao desmonte de conquistas do plano de carreira. Nesse embate entre docentes e prefeitura, o governo passa a recorrer não apenas às narrativas falsas, mas também à violência psicológica, física e ao assédio moral.

 “Recebemos muito assédio direto e indireto. Pressionaram as gestoras (escolares) para que fizessem pressão sobre os professores para que retornassem às aulas. Houve corte de salário, fake news informando valores salariais de professores acima dos reais. E por fim, como se não bastasse, eles (gestores da prefeitura) vão para a exposição pública de lideranças do movimento, da maneira mais baixa. Vereador chamando publicamente as professoras de vagabundas, de criminosas. Outro nos chamou de drogadas. Cenas de horror que vivenciamos e vivemos em nossos corpos, nesses 74 dias”, desabafou a professora Denise.

 O professor Rui Oliveira também relata a violência da prefeitura. “Nós fomos diversas vezes agredidos, de maneira moral e também corporalmente. No 2 de Julho (manifestação dos grevistas durante o cortejo cívico) foi um acirramento muito grande. O governo chegou a jogar spray de pimenta, chegando a culminar com a agressão muito forte em uma militante dos trabalhadores na Igreja Rosário dos Pretos, no Pelourinho”.

 Criminalização da greve

 Entre as várias violências sofridas pelo movimento, a/o docente ouvidos pela reportagem destacam a criminalização da greve e a perseguição às lideranças como fatos fundamentais. Mesmo diante de todos os dados que comprovam a grande defasagem salarial, desde o começo, a greve foi decretada ilegal pela justiça por não ter aguardado 72h para o início, após a deliberação da assembleia. Após o acirramento da greve, a justiça ainda impôs multas diárias à APLB-Sindicato, que já somavam mais de 5 milhões. Por descumprimento de decisão judicial, ao Coordenador-Geral do sindicato foram impostos dois processos, o confisco de bens e a ameaça de prisão.

 Além disso, o Diário Oficial do Estado publicou a convocação das/os docentes em regime REDA e em estágio probatório para que retornassem às escolas em 24h. O não cumprimento configuraria como falta grave, com a abertura de processo para a exoneração e a demissão.

 Mudança estratégica

 Diante do cenário apresentado, de um acordo firmado como fruto da resistência da categoria e, ainda, das perseguições aos colegas do movimento grevista, a professora Denise comenta a decisão da categoria pelo retorno às aulas. “Chegamos num momento de mudança de estratégia. A gente não deu um passo para trás. Estamos fazendo uma ginga, assim como na capoeira. Decidimos pelo estado de greve porque vamos manter a categoria mobilizada. Estamos mantendo a luta, mas em outras dimensões, numa perspectiva de acompanhamento de cumprimento do acordo”.

 Rui Oliveira apoia a nova estratégia deliberada pela categoria e finaliza explicando o acordo firmado entre a APLB-Sindicato e a prefeitura. “No acordo assinado o governo estabelece uma mesa setorial de negociação permanente, cria três gratificações e estabelece prazo a ser cumprido. Há luta também pela climatização das escolas até o final do ano letivo. Devolução das quantias que foram confiscadas dos trabalhadores, devolução das consignações retidas da APLB-Sindicato, revisão das multas, entre outras questões”, encerra o Coordenador-Geral.

 Vamos à luta!

 A Coordenação da ADUNEB parabeniza a APLB-Sindicato e o conjunto da categoria docente, da rede municipal de Salvador, pela bravura e conquista do acordo possível. Para a seção sindical, por mais que os ganhos de uma greve não contemplem todos os anseios da categoria, no mínimo a greve é pedagógica, planta sementes e forma novos militantes que conquistarão vitórias no futuro. Foi assim na histórica greve, no ano 2.000, das universidades estaduais da Bahia. Sem grandes conquistas naquele momento, a greve foi o início de um novo período de fortes mobilizações nos anos seguintes. Assim, em 2002, período Carlista, o Movimento Docente conquistou o Estatuto do Magistério Público das Universidades do Estado da Bahia, celebrado até hoje como um dos melhores do país.

 Todo o respeito às lutadoras e aos lutadores da rede pública de ensino de Salvador!

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