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ADUNEB discute a padização excessiva na universidade



 O primeiro dia do seminário híbrido “O PAD e a carreira profissional da(o) professora(os): uma discussão necessária nas universidades estaduais no Brasil” recebeu, na quinta-feira (02), na sede da ADUNEB, em Salvador, a Profª Drª Lis Machado, do IFSudeste (MG). Compuseram a mesa a Coordenadora de Formação Político-Sindical e Relações Intersindicais da ADUNEB, Maria Izabel Lopes de Araújo e o Coordenador Geral Clóvis Piáu. VItor Fonseca, advogado da seção sindical, também participou do encontro para apresentar um panorama da assessoria jurídica do sindicato em casos de sindicância e Processos Administrativos Disciplinares (PAD). 

Fonseca retomou o histórico das questões relacionadas aos PADs na UNEB, desde o segundo semestre de 2015 e o início de 2016, período que coincide com a primeira gestão do Governo Rui Costa. Explicou os motivos pelos quais há um quantitativo excessivo de processos desta natureza na universidade, a partir de um olhar sobre a política de contingenciamento criada sob uma perspectiva de governo no controle de contas públicas, que entendia as despesas com pessoal como o principal vilão do aumento dos gastos públicos. “Esse peso que recai sobre o Estado, na sua própria perspectiva, necessitaria de instrumentos de restrição e controle. Esse é o ideário que move o disciplinamento que se quer fazer na UNEB. Esse discurso de austeridade existe, mas tem como pano de fundo um discurso hegemônico contra os direitos das(os) servidoras(es) publicas(os), entendendo o servidor como um problema”, afirmou. 
 
Profs. Clóvis Piáu, Lis Machado e Maria Izabel Araújo
Três foram as formas, segundo o advogado, como o governo estruturou uma política severa de cortes de direitos e contingenciamento: A primeira foi legislando por decretos autônomos, como por exemplo, através daquele que, em 2015, restringiu qualquer aumento de salário, incremento de despesa ou concessão de vantagem e que ficou em vigência por tempo indefinido. “Como resultado, docentes da Universidade do Estado da Bahia amargam uma perda expressiva de valor real da remuneração ao longo desse período. Só em 2021 começam a ter algum tipo de recomposição depois de anos de restrição absoluta”. Nesse sentido, o Governo também publicou decretos trazendo para si competências que não lhe cabia.

A segunda foi a atuação abusiva e ilegal do Governo no intento de conter a qualquer custo os avanços de carreira, não permitindo que docentes tivessem promoção ao longo de vários anos e não autorizando ampliação de carga horária. “Só este ano a gente tem um acordo, um indicativo, de zerar as filas de Mudança de Regime (de Trabalho), mas já percebemos a intenção do Governo em restringir, mais uma vez, o que é direito da instituição (UNEB) de reger suas cargas horárias", afirmou o advogado. Essas ações ilegais estão sendo todas objeto de ações judiciais e isso tem gerado ataques contra a universidade. 

A terceira, trata-se de uma política de controle de gastos com pessoal centrada na fiscalização de possíveis desvios de recursos, que foi promovida no âmbito do Tribunal de Contas do Estado. A partir de auditorias realizadas por amostragem, o governo identificou possíveis irregularidades na folha de pagamento. Nesse contexto, em 2015, sem nenhuma perícia, houve um corte unilateral retirando esse direito de servidoras(es) incluindo o de todas(os) as(os) professoras(es) da UNEB. A medida abusiva deu origem a mandados de segurança garantindo a reinstauração de insalubridade para a maioria das(os) servidoras(es) do estado da Bahia. Porém, alertou Vitor, ainda existe uma política em curso para impedir a concessão do direito à insalubridade. 

“Tivemos também casos de cruzamento, por amostragem, de dados da contribuição previdenciária do INSS e do próprio Estado, a partir dos quais foram identificados possíveis indícios de violação da concessão de mudança de regime de trabalho de D.E. com   incompatibilidades de carga horária ou acumulação ilegal de cargos”, explicou Vitor. Porém, não foram identificadas na prática a adoção da apuração devida, considerando que houve a instauração arbitrária de PADs, prevalecendo um julgamento anterior a qualquer análise aprofundada dos casos. Vitor retomou a deflagração, de caráter policialesco, da “Operação D.E.”, com a divulgação do nome de 47 docentes, em Diário Oficial e na imprensa, indicando suspeita de irregularidade no cumprimento de D.E.s. “Nisso dá para entender a perspectiva punitivista, inquisitorial, sem garantia da ampla defesa e sem respeitar o processo devido, considerando que houve a instauração de PADs, que possuem caráter punitivo, sem, entretanto, a devida apuração prévia”, ressaltou o advogado. Na ocasião, o departamento jurídico da seção sindical ingressou com um mandato de segurança que logrou, liminarmente, o impedimento da tramitação de todos os processos administrativos disciplinares que estavam sendo conduzidos de forma irregular pelo Governo do Estado.

“Tendo em vista esse contexto é preciso levar em conta que não estamos falando apenas de processo disciplinar e de requisitos de lei. Estamos falando de processos punitivos que estão sendo manejados, desde 2015, como uma política de constrangimento ilegal de professores da UNEB”, destacou Vitor Fonseca. O advogado completou afirmando que da forma como a situação tem sido conduzida no âmbito da universidade, tem se constituído como uma política punitivista, que em nada contribui pela moralização e controle de desvios praticados por professoras(es). “Se há interesse de controlar desvios, existe forma legal de fazer isso. E não é através de uma lógica de constrangimento e exposição indevida de servidores”, explicou Vitor Fonseca. 

Segundo a Coordenação da ADUNEB, como a maioria dos PADs são gerados pela própria UNEB, a seção sindical não tem o conhecimento do número exato de processos administrativos em tramitação na universidade, sabe-se que são centenas de processos apuratórios com recomendação de instauração de PADs. A maioria permanece parado, pois a Comissão Processante enfrenta dificuldade para encontrar servidoras(es) disponíveis para compor as comissões, que exigem muito trabalho e possuem custos altos com gratificações aos integrantes. 

De acordo com a assessoria jurídica, as principais acusações que levam as(os) docentes filiadas(os) a recorrer à seção sindical à procura de defesa contra PAD são a acumulação de cargos, que geram incompatibilidade de carga horária; os PADs ilegais gerados a partir da Operação D.E. (2015); e demais questões disciplinares, que vão desde os conflitos e perseguições nos departamentos a acusações de faltas ao serviço, condutas inadequadas com colegas, entre outras.
 

O PAD, seus procedimentos e possíveis encaminhamentos

Profª Drª do IFSudeste, Lis Machado trouxe importantes contribuições para a compreensão dos procedimentos de instalação dos processos administrativos disciplinares, dos equívocos na compreensão de sua finalidade e de seus limites legais e para possíveis encaminhamentos no tratamento das questões dos excessos de PADs que vem sendo instaurados na UNEB.

O primeiro destaque da professora foi ao encontro do que foi destacado por Vitor Fonseca sobre a aplicação de PADs, ou seja, de processos punitivos manejados como política de constrangimento ilegal das(os) docentes. “Existe forma legal de fazer essas avaliações e fiscalizações e percebemos que tem se tornado comum a aplicação de PADs indevidos”. destacou. Considerou ainda um ponto chave sobre os processos administrativos disciplinares que é a garantia da ampla defesa, destacando a importância da fase de apuração dos fatos antes da instauração de processos dessa natureza. 

Em um passo a passo, Lis explicou, em linhas gerais, como se dão os PADs, sendo enfática ao explicar que eles se destinam basicamente a dois fins: demissão ou cassação de aposentadoria da(o) servidora(or). Porém, antes que se instaure esse processo é possível realizar uma investigação por meio de sindicância, nem sempre realizada, como pode-se perceber nos casos da Universidade do Estado da Bahia. Esse seria o âmbito da apuração, tendo o intuito da advertência e/ou suspensão. Caracteriza-se também como um processo mais curto que o PAD, com duração de 30 dias, podendo ser prorrogada por mais 30. “Se após essa apuração não couber advertência ou suspensão, o processo retorna a quem solicitou o PAD para para então ser encaminhada a instauração do PAD, isso após exaurir o processo de sindicância”, explicou.

A partir de então, uma nova comissão é formada, diferente da comissão anterior, para dar início à tramitação do PAD. Nesse item, Lis destacou também importantes pontos sobre a formação dessas comissões e princípios que devem reger suas/seus integrantes e todo processo. Ou seja, os princípios administrativos brasileiros que são os da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência. Para a professora é importante que docentes estejam cientes e tenham garantido o seu direito de acesso ao processo por sua/seu representante dativo. 

Lis Machado ainda analisou com as/os participantes da atividade artigos do Estatuto do Magistério Público da Universidade do Estado da Bahia. O objetivo foi trazer análises sobre a previsão legal em relação às cargas horárias de dedicação exclusiva e acumulação de cargos e suas devidas exceções, conforme legislação. Por exemplo, uma/um docente pode ser 40h. em uma instituição e, havendo compatibilidade de horários, excercer carga horária de 20h em outra, sendo 60h o teto estipulado em lei. Destacou ainda que no caso de acúmulo indevido, professoras(es) irão se deparar com o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado da Bahia, das Autarquias e das Fundações Públicas Estaduais, que vai tratar de deveres e proibições de servidoras(es); ressaltando o Art. 177 que informa que “É vedada a acumulação, remunerada ou não, de cargos públicos, exceto quando houver compatibilidade de horários de dois cargos de professor e de um cargo de professor com outro técnico ou científico”. Liz também enfatizou a impossibilidade legal de docentes assumirem dois cargos de D.E., por exemplo, pois acumular cargo se configura como improbidade administrativa.  

A professora levantou ainda um ponto importantíssimo que é o adoecimento das(os) servidores submetidos aos PADs, o sofrimento decorrente de processos que se estendem por tempo indeterminado gerando danos financeiros, psíquicos e até mesmo físicos às/aos servidoras/es. 

Encaminhamentos

Após conversa com as/os participantes, cujas dúvidas e respostas seguem ao final desta matéria, Lis Machado finalizou sua participação sugerindo encaminhamentos para a luta contra a padização arbitrária e abusiva no âmbito da universidade. Entre eles estão a sugestão da criação de cartilhas e a sensibilização junto à categoria em relação a deveres, direitos e penalidades relacionadas aos processos administrativos disciplinares; a instalação de uma comissão de acolhimento, junto com departamento jurídico da universidade, e a criação de um memorial de defesa da(o) professora(or) garantindo provas materiais para o enfrentamento desses processos; e a criação de um banco qualificado de membras e membros para compor possíveis comissões de PAD, com o devido treinamento e preparação e conhecimento para atuar nesses casos. 

Fique por dentro

Aqui seguem algumas dúvidas recorrentes de professoras e professores que participaram do encontro e que podem também contribuir para elucidar pontos importantes sobre os processos administrativos disciplinares.  

Sendo professor(a) D.E. posso participar de bancas de seleção e concursos?
Considerando o contexto de inúmeros PADs que não garantiram o direito à ampla defesa, recomenda-se que solicite a chancela do Departamento e, ainda, que a autorização concedida seja documentada e arquivada pela(o) docente. 

É possível instauração de PAD para professora(or) aposentada(o)? 
Sim. A partir do momento que a/o Reitora(or) tomou ciência do ocorrido ele tem tempo para nomear comissão e tem cinco dias para poder instalar o PAD. Nesse caso, ele teria como finalidade a cassação da aposentadoria.

Um PAD instaurado sem sindicância pode ser anulado? 
Não é passível de anulação. O processo só vai ficar mais caro para a instituição. A sindicância, âmbito de apuração inicial, é mais barata e tem duração mais curta. Mas sua ausência não justifica a anulação do processo administrativo disciplinar. 

É possível ocorrer afastamento preventivo na fase de sindicância? 
Sim. Durante o processo de sindicância pode ser requerido e realizado o afastamento preventivo das funções. 

O que é um representante dativo no processo administrativo disciplinar e quem pode assumir essa função? 
Qualquer pessoa com disposição a defender a/o docente em processo, sendo ou não advogado, poderá representá-la(o).
 
Leia aqui a matéria sobre o segundo dia do Seminário.