Opiniões e Debates

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RESISTIR: um novo tempo para a UNEB

Milton Pinheiro*

Ao longo dos últimos dias, em virtude da proximidade da inscrição de chapas para concorrer à reitoria da universidade, fui procurado por um conjunto significativo de colegas, amigos/a e camaradas com a perspectiva de construir uma candidatura para reitor. Trata-se de uma preocupação justa em virtude de representarmos, por integrarmos o movimento docente, um projeto alternativo que vai à raiz dos problemas da universidade. Ao tempo em que desvelamos uma proposta de fazer acadêmico que acene para o futuro da universidade descolado da colonização à qual ela foi historicamente submetida.

Contudo, antes de qualquer posição sobre essa questão, é importante entendermos o que é a nossa universidade hoje. 
A UNEB cresceu de forma desordenada, todavia, talvez essa questão não seja central no universo da problemática. Essa situação será resolvida quando, em algum momento, o mandato que estiver a frente da reitoria queira enfrentá-lo. Até porque, esse modelo administrativo, tem sido funcional aos interesses daqueles/as que até aqui passaram pela gerência da administração central. Contudo, a crise da UNEB ampliou-se e ganhou contornos de grave risco acadêmico e social. Por onde se estabeleceram os contornos dessa situação? A força motriz da incapacidade de romper o ciclo da crise é a completa subserviência da reitoria aos interesses do governo do estado e a mais profunda centralização no exercício da administração acadêmica.
 
Estamos submetidos a um modo de governar que não reconhece a centralidade estratégica da universidade pública do estado da Bahia. Esse modelo, que tem como projeto desarticular as universidades estaduais, não encontra resistência pública na conduta da reitoria da UNEB. O papel da reitoria amesquinhou-se politicamente e transformou-se em “gestor” das ações permitidas pela administração estadual. Um/a reitor/a é eleito/a para representar a comunidade universitária e afirmar, como centralidade, a defesa de uma estratégia que contribua para criar oportunidades sociais e formação crítica para o conjunto da sociedade, em especial os segmentos sociais atacados pelas mazelas do capitalismo.
 
Porém, o que podemos examinar na UNEB é um completo enquadramento na ordem da gerência do Estado. E para aqueles/as que pensam que não têm outra saída, perguntaria: quantas vezes o atual reitor convocou a comunidade universitária para debater a crise, quantas vezes o reitor foi à imprensa denunciar os ataques do governo do estado a UNEB, quantos atos foram realizados em defesa da nossa universidade? Pelo que tenho conhecimento, a resposta é negativa para todas as questões levantadas.
 
No quadro das questões que têm impactado a não resolução de problemas internos poderíamos levantar, por amostragem, algumas pistas:
 
- A capacidade administrativa da UNEB não consegue responder às demandas gerenciais que estão na ordem do dia.
 
- O corpo de funcionários dessa universidade, apesar de todo empenho que podemos comprovar, não recebeu a devida formação técnica para trabalhar com os novos sistemas operacionais que são construídos para dificultar as resoluções de problemas;
 
- O tripé acadêmico exauriu-se na destruição da extensão, pela incapacidade de avançarmos na Pós-graduação e na estagnação do ensino. Tornamo-nos uma universidade da reprodução do ensino e que executa alguns projetos de formação pelo recorte do utilitarismo;
 
- Em uma universidade com parca dotação orçamentária, o critério mais importante para reordenar as prioridades não é a concentração do orçamento. É justamente a descentralização criteriosa desses recursos para fins acadêmicos que afirmarão a possibilidade de romper com a incapacidade de funcionamento do tripé universitário;
 
- A ausência de diálogo construtivo é uma marca registrada do governo local. Conversamos de forma burocrática o que não torna possível a perspectiva de construção de sínteses reordenadoras da ação acadêmica. Docentes, analistas/técnicos e estudantes não são chamados para pensar a universidade e contribuir para uma nova perspectiva de universidade pública em tempos de crise sistêmica. Nesse sentido, faz-se urgente a construção de uma estatuinte democrática/paritária e a afirmação dos princípios que definirão uma proposta de orçamento participativo.
 
Retorno ao ponto de partida... Não serei candidato a reitor, mesmo frustrando a imensa perspectiva daqueles/as com os/as quais dialogamos na construção da resistência por outra universidade, que viam na minha candidatura uma alternativa ao governo local.
 
Estarei nas lutas por dignidade docente que requer projetos de fixação dos/as docentes nos campi do interior, com a aprovação de uma bolsa permanência que os/as professores/as possam usar para morar ou se deslocar, tirando-os/as da completa humilhação que acontece hoje com a questão das passagens.
 
Numa universidade com incompleta titulação acadêmica, e com poucos programas de pós-graduação, precisamos de uma ação institucional que se comprometa em criar condições acadêmicas e bolsas para todos/as (docentes e analistas/técnicos) que estejam no mestrado, doutorado e pós-doutorado. Trata-se de compreender uma necessidade estratégica que não tem como ser resolvida através de editais restritivos.
 
A plena funcionalidade da universidade está condicionada à criação de condições para que os segmentos internos possam desenvolver suas potencialidades. É imperiosa a necessidade de formação para analistas/técnicos com a devida institucionalidade das condições de trabalho e respeito à sua carreira. É urgente que a UNEB crie condições de permanência para os/as estudantes. Precisamos de uma ação interna que efetive restaurantes universitários e possibilitem condições de acesso ao estudo e à iniciação científica.
 
São muitas questões para debater e dialogar. Estarei na planície das nossas batalhas. Continuo do mesmo lado da vida e da história. Lutarei para que a UNEB resista e construa, de forma coletiva, um novo tempo.
 
 
Prof. Dr. Milton Pinheiro
Sociólogo e cientista político, pesquisador da área de história política na USP, professor do Programa de História, cultura e práticas sociais da Universidade do Estado da Bahia (DEDC II). Editor da revista Novos Temas e autor/organizador de 07 livros por editoras de circulação nacional. Integra os grupos de pesquisa: Pensamento Político Brasileiro e Latino-Americano (UNESP); Núcleo de estudos sobre ideologia e lutas sociais (PUC/SP) e o NETPS (UESB). Tem dezenas de artigos publicados no Brasil e no exterior. Foi diretor eleito por dois mandatos para o DEDC II (UNEB). No momento é coordenador geral da Aduneb e coordena o Fórum das Associações Docentes das Universidades Estaduais da Bahia (FAD).