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Saúde do Professor em debate



Começa hoje (31/7) e encerra em 1°/8, o Encontro Nacional sobre Saúde do Trabalhador. O evento, promovido pelo ANDES-SN e pela Adunifesp, será realizado na Unifesp-SP e tem como tema “A educação submissa à lógica do capital: da precarização do trabalho docente à saúde do professor. Os desafios atuais”.

Na programação, além de pesquisadores do tema e lideranças sindicais do movimento docente ligado ao ANDES-SN, vão participar do Encontro representantes dos Ministérios da Saúde (MS) e do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) e do Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde dos Ambientes de Trabalho (Diesat).

Nas duas últimas décadas, estudos e pesquisas sobre saúde do professor revelam vários tipos de doenças adquiridas por causa da intensificação do trabalho e das relações entre docentes e instituições de ensino. Os estudos mostram que essas doenças não discriminam setores: elas atingem professores de ensino fundamental, médio e universitário, tanto do setor público como do privado.

Os estudos indicam as causas e as conseqüências das doenças e chegam a afirmar que a educação brasileira está ameaçada de extinção, caso não se promovam políticas de valorização do professor. No entendimento do ANDES-SN, somam-se a essas causas, a redução do padrão de vida dos professores, a precarização das condições de trabalho, o aumento da exclusão social, o aprofundamento do desemprego e o arrocho salarial.

E mais, atualmente, a flexibilização e a precarização das relações de trabalho, a supressão de conquistas sociais e a intensa política de reestruturação das carreiras profissionais, que favorecem a sobreexploração, são fatores que fazem adoecer não só os trabalhadores, mas também instituições.

Magistério provoca doença no Rio Grande do Sul

Em junho desse ano, o Diesat e o Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul (Sinpro-RS) publicaram uma pesquisa sobre as condições de trabalho e saúde dos trabalhadores do ensino privado do estado.

A pesquisa – que descreve o perfil das doenças causadas pela execução do magistério e pela relação dos docentes com o sistema privado de educação – indica que 45% dos professores que responderam aos questionários apresentam algum problema de saúde física ou mental relacionado a seu trabalho. Uma das conclusões da pesquisa ressalta que “os principais fatores prejudiciais à saúde dos professores do ensino privado apontam diretamente para a organização do trabalho e as relações de trabalho”.

Nas escolas privadas do Rio Grande do Sul, de acordo com a conclusão da pesquisa, “fatores, como a jornada de trabalho, excesso de atividades, pressão de chefias e de colegas de trabalho, assédio moral no trabalho, relação com chefias, colegas professores, pais e alunos, estão entre os principais geradores de agravos à saúde física e mental dos professores”.

O problema é que esse tipo de quadro clínico não atinge somente os professores da rede privada de ensino do Rio Grande do Sul. Trata-se de uma situação que atinge alto percentual de profissionais da área em todo o Brasil, tanto do sistema privado como do sistema público de educação.

Síndrome de Burnout põe educação em risco

No fim da década de 1990, o professor do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), Wanderley Codo, promoveu um estudo, considerado único no Brasil, tanto pelo aprofundamento como pela extensão, sobre uma doença que leva o docente a perder o sentido de sua relação com o trabalho.

O professor da UnB e a equipe que participou do trabalho constataram que mais do que um sintoma do estresse, a Síndrome de Burnout é uma epidemia que, no fim da década de 1990, atingia 48% dos 52 mil professores investigados em 1.440 escolas espalhadas nos 27 estados da Federação brasileira.

A partir das análises decorrentes da pesquisa – o que pode ser conferido no livro “Educação: carinho e trabalho”, Ed. Vozes – o pesquisador afirma que essa doença pode até a vir a destruir a educação brasileira. O principal sintoma é a desistência. O docente desiste da profissão e passa a exercê-la sem interesse, “de forma que as coisas já não o importam mais e qualquer esforço lhe parece ser inútil”.

O esgotamento profissional e o estresse provocados pelo não-reconhecimento do profissional, pelas condições precárias de trabalho, pela desvalorização salarial são alguns dos elementos que mantêm viva a Síndrome da Desistência (burnout).

Segundo Codo, o INSS quer transformar a síndrome em doença profissional. “Se acontecer isso, o professor vítima de burnout vai ser afastado da profissão e, de burnout, ele passará a ter depressão, visto que a doença é provocada pela ausência do controle sobre o trabalho que desenvolve, ou seja, ele vai piorar”. Quando pesquisas sobre burnout foram executadas em outras categorias profissionais, a conclusão foi semelhante. Os profissionais da saúde, por exemplo, padecem do mesmo problema.

Preocupado com os encaminhamentos do governo para o problema de burnout no Brasil, o professor ressalta que, além de salário digno, condição de trabalho decente, reconhecimento profissional, o docente precisa de carinho para superar a doença e exercer o magistério. Tanto é que em alguns países, professor tem título de nobreza”, diz Codo.

Fruto de uma parceria entre a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e o Laboratório de Psicologia do Trabalho da UnB, a pesquisa – que relata as condições de trabalho e saúde mental dos trabalhadores em educação do ensino fundamental e médio da rede pública do país – foi executada entre 1996 e 1998. Até hoje nenhuma política pública foi elaborada para resolver o problema.

Outra pesquisa, também realizada no Instituto de Psicologia da UnB pela psicóloga Nádia Maria Beserra Leite sob a coordenação do professor Codo, que analisou 8.744 questionários respondidos por professores da região Centro-Oeste, indica que 15,7% dos professores de ensino fundamental e médio são vítimas dessa síndrome.

Precarização adoece docentes da América Latina

A precarização das condições de trabalho docente e os problemas daí decorrentes é uma realidade que atinge os profissionais da área nos diferentes continentes, ultrapassando fronteiras, e tem se agravado conforme a intensificação da lógica produtivista em curso, seja no mundo globalizado, em geral, seja no campo educacional, em particular.

Em um trabalho intitulado “Precarização do trabalho docente na Argentina, Colômbia e Brasil: um estudo comparado”, apresentado no Primer Encuentro Latinoamericano de Estudios Comparados en Educación,, realizado em Buenos Aires em junho de 2007, os pesquisadores Cristina B. Oliveira e Gustavo B. Bicalho Gonçalves, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), demonstram que a precarização atinge a América Latina.

Segundo eles, “a precarização do trabalho docente pode ser definida como conseqüência do contexto neoliberal - globalização, novas tecnologias de informação e comunicação, nova reordenação do processo de automação em nível internacional, que modificam a estrutura produtiva e a organização do trabalho”.