Opiniões e Debates

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SEM CONSOLIDAÇÃO DE MESTRADOS, DOUTORADOS E DA UNEB, RISCOS DE EXTINÇÃO

Senhoras e senhores,

 

As fronteiras são muito tênues na UNEB entre ser uma universidade com ensino, pesquisa e extensão, e ser apenas um Centro de Educação Superior com apenas ensino, extensão e programas especiais. A diferença, reconhecida nacional e internacionalmente, entre uma universidade e um centro de Educação Superior, reside única e exclusivamente na existência de programas consolidados de Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado, isto é, na consolidação de uma infra-estrutura física, tecnológica e de recursos humanos para que o conhecimento, com originalidade e filosofia própria, sejam produzidos com e para a sociedade e não apenas reproduzido como nos Centros de Educação Superior.

 

Feito esse breve preâmbulo, interpelamos:

 

Prezados estudantes unebianos, vocês que distribuídos por essa Bahia cheia de enigmas e de injustiças, e portando o fogo e brilho da revolução nos olhos, prefeririam transitar num espaço que lhe ofereça ferramentas para decifrar os enigmas e superar as injustiças, ou apenas reproduzir conhecimento e ser mais um do rebanho? Batalhem urgentemente por sua Iniciação Científica, levem adiante suas pesquisas e Trabalhos de Conclusão de Cursos e assim, com seus orientadores, teremos uma legião de futuros pesquisadores não apenas completando sua formação em programas da UNEB, mas de todo Brasil e fora dele;

 

Caros colegas professores da UNEB, apesar dos problemas quase infinitos que nos afligem (salários aviltantes, falta de condições de trabalhos, sobrecarga de atividades, entre outras) existe universidade, na face da terra, mais generosa do que esta? Primeiro, por sua duplicidade, é ao mesmo tempo UNEB e UNEP (Universidade Estadual Paralela) e como tal pode-se multiplicar o tempo do trabalho, as fontes de recursos, os métodos de produção ou reprodução do conhecimento e aferição de aprendizagens; segundo, e exatamente por essa duplicidade anômala, temos, como nenhuma outra universidade, um crivo para se separar o joio do trigo: quem pesquisa, quem frequenta programas de pós-graduação stricto sensu, quem participa da Iniciação Científica, quem orienta TCC a partir do 5º semestre, quem defende e promove a criação de mestrados e doutorados, quem substitui na graduação professores do corpo permanente em seu tempo de produção e consolidação dos programas existentes? Novas exigências institucionais do mundo da ciência contemporânea estão cada vez mais levando-nos a uma decisão definitiva: Universidade ou Centro de Educação Superior? Afinal, de que lado você samba, de que lado você vai sambar?

 

Caros Diretores,

Caros Coordenadores de Colegiado,

 

No Regulamento da Pós-graduação stricto sensu, de 18 de março de 2008, no art. 66, temos que professores/as de DE ou 40 horas, credenciados/as como permanentes, devam dar no mínimo 8 horas de aulas semanais na graduação. Considerando que Documentos da Área de qualquer programa credenciado pela Capes exigem que tais pesquisadores dediquem o mínimo de 30 horas semanais com ensino, pesquisa e orientação, perfazendo, portanto, uma sobrecarga de 70 horas semanais (isso porque as 8 horas da graduação são no mínimo 30 horas...), qual a leitura dos senhores em relação a essas duas exigências? Ou ainda: qual a posição de colegiado e departamento em relação às formas de aferição de produção na UNEB e nos Comitês de Área da Capes? O seu Departamento está preparado para um programa de Pós-graduação que, em qualquer lugar, tem que efetivamente pesquisar para produzir conhecimento?

 

Senhores Pró-Reitores de Pesquisa e Ensino de Pós-graduação, Ensino de Graduação, Planejamento, Administração, Assistência Estudantil, Gestão e Desenvolvimento de Pessoas, eis algumas questões: de que forma uma infraestrutura de pesquisa, da graduação ao Pós-doutorado, repercute transversalmente em seus domínios de gestão? Por que mesmo com as novas licenciaturas atinadas à pesquisa, não temos ainda um TCC com status de Iniciação Cientifica, e ainda um discurso de que na UNEB a ênfase deva ser o ensino, pois se está formando professores apenas para a Educação Básica? Por que em reuniões organizadas pela PPG, com interessados em pesquisa, dificilmente a PROGRAD aparece, e quando se encaminha questões de relevância (seminário sobre política de publicação, ampliação da infraestrutura de gestão em cada programa, gerenciamento de recursos da FINEP, escritura definitiva da sede de cada Campus, exigível sempre, quando se trata da instalação de recursos federais, entre outras questões), dificilmente se tem um retorno como uma solução dos problemas identificados, e que continuam, sempre retornando, de reunião em reunião?

 

Magnífico Reitor, se a pesquisa, em sua gestão, substituiu a ênfase na extensão e no ensino de graduação, por que cresceu mais o número de “bolsas” da Plataforma Freire, via Capes, do que as de Produtividade científica, via CNPq e FAPESB?

 

Senhoras e senhores, já que em grande parte o problema é do governo, em seus âmbitos estadual e federal, e crendo que nenhum dos senhores, senhoras, seja contra a criação e consolidação de mestrados e doutorados, como uma condição para que a UNEB não seja rebaixada à categoria de Centro de Educação Superior, o que fazer para impedir isso? Ou de outra forma: se boa parte dos senhores e senhoras são indiferentes ao fato de a UNEB ser uma universidade ou um Centro de Educação Superior, como contar com o vosso apoio nessa luta institucional para que a prática efetiva da pesquisa avançada e pós-graduada seja uma realidade na UNEB?

 

Senhor governador Jacques Wagner, Sra. presidenta Dilma Roussef, secretários e ministro da educação, sabemos todos que um dos “novos” paradigmas do conhecimento no Brasil é ser sindicalista, que com apenas o Ensino Médio se chegue à Presidência da República, e que o outro paradigma a ser refutado é o de ser doutor, com o seu balcão de negócios e suas negociatas. Mas queremos propor uma reflexão acerca de um outro paradigma: se, conforme dados do Sistema Nacional de Pós-graduação 2006-2010, no Brasil, antes de 2005, tínhamos 6 doutores por cada 100 mil pessoas, na Alemanha 29 doutores por cada 100 mil, e que se chegássemos a 10 doutores para cada 100 mil, em 2010 (meta que não atingimos) atingiríamos o nível da Coréia do Sul na década de oitenta do século XX, então Sr. Governador, Sra. Presidenta, e ministros responsáveis, por que investir mais em futebol - que já tem sua própria indústria - do que na formação de cientistas (da educação fundamental ao Pós-doutoramento?). Nesse sentido, como um país, sem multiplicar os programas stricto sensu e consolidá-los por todo o Brasil, sem ampliar significativamente o número de doutores e garantir-lhes condições efetivas de trabalho científico, terá esse país condições, junto ao menos ao BRIC, de algum protagonismo educacional e científico?

 

Se vossa senhoria, ilustre governador, pensasse por um instante numa outra noção de matéria prima, máquinas e fábricas, tendo como referência de matéria prima, máquinas e fábricas a sensibilidade artística em emergência na Bahia, através dos projetos AVE (Artes Visuais Estudantis), FACE (Festival Anual da Canção Estudantil) e TAL (Tempo de Arte Literária) das Intersetoriais da Secretaria da Educação do Estado da Bahia, associados – esses projetos – aos programas de Pós-graduação stricto sensu, como mediadores dos Núcleos de Cultura a serem criados em toda rede escolar pública, teríamos não só uma revolução cultural e tecnológica na Bahia e da Bahia para o Brasil e países emergentes, mas a construção de certas condições para a cultura científica – na Bahia – sustentar as lutas de reparação econômica, cultural e identitárias do povo baiano contra as formas de exploração, sejam elas coloniais ou neo-liberais.

 

Mas não é essa articulação entre escola básica e programas de pós-graduação que vimos na Bahia, senhor governador, antes disso, temos: a) a proliferação de apenas programas especiais, importantes, em Bahia carlista e semi-analfabeta, mas sem contribuição alguma para que se amplie a criação e consolidação de programas de doutorado nas universidades estaduais da Bahia e, com isso, contribuir, como política de estado, com as metas do Sistema Nacional de Pós-graduação; b) a falta de autonomia das universidades para criarem e gerirem sua política científica avançada, pois as coleiras eletrônicas as impedem até mesmo de comprar material de consumo e de primeira necessidade; c) o desprezo visível, enfim, por um possível sistema científico avançado e pós-graduado nas IES públicas da Bahia.

 

Por fim, devemos acrescentar ainda, senhoras e senhores, que a Capes e o CNPq, apesar de todas as críticas e contestações que nós, pesquisadores, situados em regiões periféricas do Brasil podemos fazer, de fato é um patrimônio do Brasil semelhante a Petrobrás e a Infraero, e que graças a essas instituições, temos tido a garantia de uma referência de qualidade científica em condições de competir com Centros Internacionais de Pesquisa em movimento produtivo há mais de 500 anos, quando nossa principal universidade tem sequer 70 anos e seus programas menos de meio século e, além dessa garantia de qualificação – não apenas pura quantificação – também um sistema efetivo de resistência à privatização definitiva do sistema científico brasileiro.

 

Por isso, o impacto social resultante do fechamento definitivo de programas de pós-graduação stricto sensu, e o que eles representam para o desenvolvimento da sociedade, é muito maior do que a defesa, por parte da comunidade científica, do funcionamento integral de suas atividades durante período de greves.

 

Por uma expressão política JÁ de professores credenciados e estudantes matriculados em Programas de Pós-graduação stricto sensu da UNEB, UEFS, UESC, UESB;

 

Que todos os estudantes da graduação se vejam JÁ como os futuros pesquisadores da Bahia e do Brasil e se juntem a nós nessa luta;

 

Que todos os estudantes e professores da rede de escolas estaduais e municipais da Bahia, em luta pela criação dos Núcleos de Cultura, possam contar com os mestrados e doutorados das IES públicas da Bahia na luta pela ampliação da transferência dos resultados das pesquisas que alimentarão essa rede libertária;

 

Que Diretores, Coordenadores de Colegiado, Pró-Reitores, Reitores, das IES públicas da Bahia, pautem a defesa intransigente dos Programas de Pós-graduação stricto sensu apesar da miséria de suas graduações. Não será opondo a graduação à Pós-graduação que teremos uma universidade pública, gratuita, laica, de qualidade e socialmente referenciada;

 

Que a cultura científica avançada e pós-graduada na Bahia e no Brasil seja tão pop como o futebol e a música, para superarmos definitivamente as ordens de despejo linguístico, cultural e territorial empreendidas pelo sistema de Capitanias Hereditárias, ainda hoje presentes na forma do estado e suas coleiras eletrônicas.

 

Alagoinhas, 29 de abril de 2011.


Comunidade científica do Pós-Crítica